Frente às demandas da sociedade urbana contemporânea, o futuro é promissor para a arquitetura e o design terapêuticos.
O conceito de arquitetura sensorial, ou arquitetura terapêutica, não é recente, mas sua presença no Brasil ainda é tímida. No entanto, o desenvolvimento tecnológico, com novas ferramentas e mecanismos que se tornam cada vez mais utilizados em projetos arquitetônicos e urbanísticos, tem contribuído para tornar a arquitetura sensorial cada vez mais acessível, presente e difundida em projetos de espaços públicos e privados.
Originalmente a arquitetura sensorial e terapêutica foi desenvolvida a partir de estudos sobre a relação entre o espaço construído, o mobiliário, o design e o comportamento das pessoas, com foco nos sentidos (o tato, o olfato e a visão, principalmente), com maior aplicação em instituições médicas, hospitalares e psiquiátricas. Dentre os principais questionamentos que nortearam as reflexões sobre essa prática estavam as hipóteses de “se” e “como” as características construtivas poderiam contribuir positivamente para a melhora de pacientes internados.
Com o tempo, a comunidade científica da área médica passou a perceber que o espaço construído poderia desempenhar um papel terapêutico maior do que a simples organização das construções e abrigar tanto as funções médicas quanto as necessidades dos pacientes. Enquanto isso, a relação entre o espaço e os sentidos humanos no âmbito residencial e familiar sempre foi traduzida na conexão entre o lugar e a memória – uma dimensão mais subjetiva. A experiência de cada pessoa com a sua casa, com a sua cidade natal, com praças que frequentava na infância, com espaços escolares, permanece no tempo – ainda que esses lugares sejam modificados com o passar dos anos.
Da Arquitetura Hospitalar à Arquitetura Terapêutica ou Sensorial
Arquitetos, engenheiros e clínicos se engajaram em estudos, coleta de dados e análises sobre as percepções das pessoas com relação ao ambiente construído em termos sensoriais.
O pressuposto basilar para transcender do conceito de arquitetura hospitalar ortodoxa e tradicional para o conceito de arquitetura terapêutica e sensorial está no dado de que as pessoas interagem e trocam informações com o espaço construído por meio dos sentidos – a visão, o tato, a audição e inclusive o olfato. Percebeu-se que as características do ambiente podem provocar reações e sensações diversas, facilitar ou restringir processos interativos, permitir acessos ou representar obstáculos.
Conforto, ou desconforto, tranquilidade, ou inquietação, são exemplos de sensações que podem ser resultado dessas experiências e comprovam de forma empírica o que pressupõe o conceito da arquitetura sensorial no que se refere às percepções objetivas e subjetivas das pessoas sobre os espaços construídos.
A habilidade de pensar e criar espaços inclusivos e acessíveis, que apresentem o mínimo de barreiras sensoriais possível e, pelo contrário, permitam a interação com a arquitetura em múltiplos meios, facilitando processos sensoriais fluidos, tem o potencial de transformar o ambiente construído atribuindo à arquitetura qualidades restaurativas e terapêuticas para promoção de bem-estar físico e mental para as pessoas que ocupam esses espaços.
O conjunto de experiências humanas sensoriais com relação à arquitetura dos ambientes construídos atribui significados às construções e produções arquitetônicas. Os símbolos que os espaços físicos passam a representar, e os significados que os espaços físicos passam a comunicar, revelam dimensões subjetivas da arquitetura – ou seja, aquilo que não é percebido em sua forma material, construída, mas sim na mente e psicológico dos usuários.
Além da forma e da função, ou seja, respectivamente as características construtivas e a organização espacial proporcionada pelo ambiente construído em resposta às necessidades básicas e funcionais das pessoas – que são universais e estão colocadas de forma muito objetiva na arquitetura – os efeitos da arquitetura com relação às emoções, pensamentos e sensações humanos são também subjetivos, individuais e pessoais.
Ao mesmo tempo em que os arquitetos e engenheiros influenciam as experiências das pessoas por meio do espaço projetado, as pessoas atribuem significados e transformam os espaços construídos para além das experiências propostas por aqueles que os projetaram.
O futuro do design terapêutico na arquitetura
A arquitetura terapêutica, de modo simples e objetivo, consiste na habilidade de desenvolver soluções para o design terapêutico de espaços, ambientes, cenários, mobiliários e equipamentos, de forma centrada na experiência sensorial das pessoas com o espaço construído, para habilitar benefícios físicos e mentais por meio das interações com formas, na oposição entre cheio e vazio, cores, texturas, luzes e sombras, ventilação, iluminação natural, sons, dentre outros.
Contudo, além de experiências previstas e propostas como intenção do projeto arquitetônico, o exercício de pensar, projetar e construir espaços ricos no sentido de estímulos sensoriais têm o potencial de promover resultados não imaginados, mas que provocam e desencadeiam experiências subjetivas, criativas e inovadoras por meio da arquitetura como instrumento terapêutico.
O espaço que os benefícios terapêuticos em potencial da arquitetura e do design terapêutico vêm ganhando está diretamente associado ao crescimento da importância e do foco destinados mundialmente à saúde física e mental de maneira geral – seja individual ou coletiva, em espaços privados e em espaços públicos.
É importante destacar que as mudanças demográficas, o envelhecimento da população mundial, as restrições financeiras em contraposição às demandas por melhorias em infraestrutura, os altos níveis de estresse e de ansiedade sociais, dentre outras questões, são parte das motivações que colocam aumentam a demanda por projetos que contemplem a aplicação de preceitos próprios da arquitetura sensorial.
Além disso, as experiências sensoriais relacionadas ao ambiente construído caminham lado a lado, de forma próxima e íntima, com a acessibilidade e a mobilidade na arquitetura e no urbanismo.
Esse conjunto de fatores sinaliza um futuro promissor para o design terapêutico de maneira geral, ao qual arquitetos, engenheiros, designers e construtores devem estar atentos, para impulsionar a criação de técnicas e tecnologias construtivas disruptivas, na direção de soluções criativas, econômicas e eficientes para problemas humanos individuais e coletivos na sociedade urbana contemporânea.
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