No final de 2019, o mundo foi surpreendido com o novo coronavírus, juntamente a seu alto contágio e poder de letalidade, uma pandemia global foi declarada. O efeito físico causado pela doença nas pessoas é apenas uma parte do que estamos vivendo em 2020; o fator urbanização é um aspecto crucial na propagação da COVID-19. Embora não se discuta o suficiente acerca dos problemas urbanos no contágio da doença, as condições de alta densidade demográfica e constantes aglomerações vividas nas cidades tornam esse cenário perfeito para a rápida propagação do vírus.
Atualmente, as cidades abrigam mais da metade da população mundial e são responsáveis por 70% do PIB global. Ao mesmo tempo que o ambiente urbano pode gerar oportunidades profissionais, acesso à educação e novas conexões sociais, também causa impactos gigantescos ao meio ambiente, carrega marcas nada desejáveis de pobreza, desigualdades sociais e falta de segurança.
Dessa maneira, repensar o modelo atual de urbanização é primordial. Em um momento em que há flexibilização na ocupação de espaços físicos e mais pessoas estão convivendo em locais públicos em relação ao início da pandemia, é indispensável que toda essa interação seja repensada. A maneira como as pessoas vivem, trabalham e se divertem trará novas reflexões para o planejamento urbano futuro.
A importância do controle de densidade populacional
Apesar de certamente termos um futuro com mudanças em relações urbanas pós pandemia, é fundamental ser realista. Não devemos esperar um abandono das cidades para os subúrbios ou para o meio rural; ao invés disso, especialistas da área sugerem novos modelos de gerenciamento de densidade demográfica.
Através de novas estratégias de design, regiões com grande concentração de pessoas em restaurantes, prédios comerciais e no transporte sofrerão alterações. Exemplificando essa gestão estratégica, podemos destacar o papel da automação: onde há alta densidade, deve-se diminuir ao máximo interações com toque. É o caso dos edifícios que estão implantando em elevadores a tecnologia touchless para acionar o botão do andar que se deseja chegar, eliminando a necessidade do contato com o painel.
Automação em elevadores: solução para grandes centros.
A importância de cidades policêntricas
Seguindo a linha da gestão de design urbano, a pandemia da COVID-19 pode impulsionar novos modelos de cidade, principalmente em grandes centros. Um novo planejamento nos leva ao conceito de cidade policêntrica.
A ideia consiste em equilibrar a densidade populacional, ao invés de concentrar áreas apenas residenciais, industriais ou comerciais. Os deslocamentos de grandes contingentes maximizam a disseminação de doenças, caso do novo coronavírus. A descentralização dessas áreas, em um modelo urbano de múltiplas centralidades, diminui os constantes deslocamentos de pessoas e, consequentemente, também minimizam a multiplicação de enfermidades indesejadas entre indivíduos.
Essa diversificação também melhora a qualidade de vida das pessoas. Menor tempo de deslocamento corresponde a menos stress, melhora da saúde de maneira geral, mais tempo para atividades físicas e menor dependência de transportes públicos diversos.
O papel da tecnologia no trabalho e nas relações pessoais
No início da pandemia, em que houve um isolamento social obrigatório, uma das frases mais faladas no meio profissional foi: “quantas reuniões poderiam ter sido resolvidas por e-mail ou através de vídeo conferências?” A tecnologia mostrou que diversas interações podem ser feitas virtualmente, e que os resultados podem ser até melhores. Descobrimos situações em que o deslocamento urbano e a inserção em aglomerações são desnecessários.
Uso da tecnologia durante a pandemia.
Muitas pessoas descobriram o significado do teletrabalho, inclusive nos contratos trabalhistas. Algumas empresas adotaram esse tipo de regime, em que o funcionário trabalha apenas de maneira remota e não é permitido visitar o espaço físico profissional mais do que duas vezes por semana.
Obviamente, essa mesma tecnologia provocou reações diversas nas pessoas. A vontade de estar junto e as saudades que sentimos nos levou a fortalecermos nossos laços afetivos, através de um espírito solidário. Sabemos que essa união é um ponto chave para o enfrentamento desse difícil momento, e que a tecnologia pode desempenhar um papel fundamental nessas novas formas de viajar, trabalhar e viver em sociedade.
Figura 3 – Uso da tecnologia durante a pandemia.
Novas áreas verdes
A vida nas cidades pós-pandemia também pode ser revista de forma a se valorizar as áreas verdes, principalmente em grandes centros urbanos, como São Paulo. A ideia traz benefícios sociais, estéticos, culturais e sobretudo de saúde às pessoas. Ampliar áreas verdes traduz-se em mais lazer, melhoria na qualidade do ar, melhores condições de convivência, condições climáticas muito mais salubres; é uma maneira de aliviar o caos dos grandes centros através da convivência em áreas públicas frescas e arborizadas.
Justamente no momento em que todos pensam como será a vida em espaços comuns pós-pandemia, acredita-se que um maior contato com a natureza é uma estratégia fundamental. Ruas, praças e parques – além de regiões subutilizadas, como os becos e áreas vazias – serão fundamentais na formação de novos corredores verdes, propiciando um convívio social ao ar livre, através de atividades de lazer, esporte e cultura. Podemos destacar uma maior arborização do sistema viário, calçadas largas e arborizadas, ampliação de ciclovias e pistas de caminhadas. Através dessas mudanças, tornamos nossa sociedade mais inclusiva e saudável.
Criação de novos parques e áreas arborizadas.
Gestão pública: investimento democrático em infraestrutura
Como vimos, diversas mudanças serão necessárias em meios urbanos pós-pandemia. Para que isso se concretize, uma boa gestão pública para se planejar ações, investir em infraestrutura e tornar as cidades mais acessíveis e menos desiguais é fundamental; sobretudo no Brasil, em que as grandes cidades vivem diversos problemas de qualidade do ar, concentração de renda, marginalização, baixa densidade de áreas verdes e distribuição demográfica deficiente.
Além disso, deve-se usar o caos provocado pela pandemia a favor de um aprendizado unificado na erradicação de doenças. A saúde humana tem forte ligação com os cuidados às outras espécies de animais e ao meio ambiente, afinal, não se resume ao coronavírus. Diversas doenças são transmitidas diariamente, através de insetos, carrapatos, bactérias e outros vetores; esse combate precisa de seriedade e fiscalização.
É necessário um planejamento urbano integrado, através de redes de transporte eficazes, fornecimento de energia, manejo demográfico e integração populacional em novas áreas públicas verdes. Além disso, criar campanhas massivas de cuidados à saúde individual e coletiva são obrigatórias. O enfrentamento da COVID-19 escancarou fraquezas já presentes em nossa vivência urbana. Essas deficiências devem ser seriamente combatidas, para que possamos nos tornar uma sociedade mais igual e resiliente.
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