Apesar de abordarem conceitos diferentes, design inclusivo e acessibilidade são essencialmente complementares e caminham lado a lado na direção de soluções criativas para a arquitetura e o urbanismo contemporâneos.

Os dois conceitos se inter-relacionam de forma íntima ao pensar em soluções para uma arquitetura mais inclusiva de espaços públicos e privados.

Design Acessível vs Design Inclusivo

O conceito de design acessível considera que não é sempre possível ou viável alcançar um grau absoluto de universalidade no desenho de um produto ou serviço para toda a população.

Na prática, o design acessível trabalha soluções para pessoas com limitações. Isso quer dizer que a acessibilidade se concentra no resultado final (no projeto em si).

No entanto, esse conceito não leva em consideração a dinâmica de utilização da solução pelas pessoas e a interferência que o ambiente pode ter nesse processo.

Por sua vez, aquilo que é considerado inclusivo observa as diferenças existentes entre as pessoas na sociedade.

O British Standards Institute define design inclusivo como elemento capaz de tornar produtos e serviços acessíveis e utilizáveis pelo maior número de pessoas sem a necessidade de adaptações. No Brasil, mantendo o mesmo entendimento, reconhece-se o desenho universal como responsável por assegurar a todas as pessoas a autonomia, segurança e conforto.

DECRETO Nº 5.296 DE 2 DE DEZEMBRO DE 2004. Regulamenta as Leis nos 10.048, de 8 de novembro de 2000, que dá prioridade de atendimento às pessoas que especifica, e 10.098, de 19 de dezembro de 2000, que estabelece normas gerais e critérios básicos para a promoção da acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com mobilidade reduzida, e dá outras providências.

Ou seja, o design inclusivo pensa na experiência do usuário e nas variáveis que podem fazer com que alguém não tenha uma experiência plena com algum projeto.

Ele é focado no processo de criação, para que o maior número possível de pessoas consiga, de fato, utilizar a solução.

O que é Acessibilidade na arquitetura e urbanismo?

A Acessibilidade na arquitetura é respaldada pelas normas técnicas nacionais e pela legislação federal (NBR 9050 e Lei 10.098), e pode ser definida pela capacidade de pessoas se deslocarem, acessarem e terem experiências sensoriais no ambiente construído, seja ele público ou privado, independentemente de deficiências de natureza física, motora, sensorial ou intelectual.

O movimento por uma arquitetura inclusiva e cidades acessíveis reconhece que o design e as características construtivas dos espaços podem resultar em lugares discriminatórios, quando não consideradas as diferenças existentes entre as pessoas.

O Design Inclusivo como ferramenta para a arquitetura inclusiva em cidades acessíveis

Parque da Amizade

O Parque da Amizade é um espaço público para atividades recreativas, onde crianças e jovens podem participar independentemente das suas capacidades físicas ou cognitivas. Localizado no parque de Villa Dolores de Montevidéu, ao lado do Planetário Municipal, tornou-se o primeiro parque com propriedades totalmente inclusivas no país. Mais sobre este projeto

Pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida são diariamente discriminadas e excluídas pela experiência não democrática nas cidades, nos espaços públicos e privados, e ao interagir com barreiras que prejudicam ou impedem a sua participação plena, efetiva e igualitária com as demais pessoas na sociedade.

Essas barreiras podem ser:

1. Físicas e visíveis

Como barreiras urbanísticas e arquitetônicas, as quais limitam a liberdade e autonomia de movimento, que são qualquer entrave ou obstáculo que obstrua a mobilidade e a acessibilidade nas vias, calçadas, espaços de uso coletivo, e nos edifícios públicos e privados, bem como prejudiquem ou impossibilitem o uso de mobiliário urbano (instalações públicas de uso coletivo);

2. Psicológicas e invisíveis

Como barreiras à comunicação, à informação, à educação, ao trabalho, à expressão e à compreensão, como atitudes e comportamentos que impeçam a participação social e exercício dos direitos da pessoa.

Buscando superar tais obstáculos, o design inclusivo pauta-se em algumas diretrizes:

  • Desenvolver soluções que ofereçam a maior cobertura possível das diversidades conhecidas de pessoas e grupos de usuários;
  • Buscar a acessibilidade e a usabilidade por meio de soluções simples, que não demandem habilidades complexas, garantindo a experiência do usuário para o maior grupo possível de pessoas em situações variadas;
  • Considerar a previsão de soluções ou adaptações customizadas para atender demandas específicas de grupos com necessidades especiais.

Partindo dos mesmos pressupostos, a arquitetura inclusiva apresenta como principais diretrizes os seguintes itens:

  • Garantir acessibilidade física para todas as pessoas, incluindo grupos com mobilidade reduzida, que utilizem dispositivos auxiliares de marcha e ou cadeiras de rodas, com deficiência visual ou qualquer outro tipo de deficiência que impacte na capacidade de se deslocar de forma autônoma no espaço;
  • Possibilitar a flexibilidade, o conforto e a segurança na experiência de todas as pessoas no espaço construído;
  • Combinar forma, função e estética na criação de soluções práticas que permitam a inclusão universal e o uso flexível.

O design inclusivo, portanto, é um conceito que pode se tornar uma poderosa ferramenta de projeto nas mãos dos arquitetos e urbanistas.

Estudando as regulamentações e incorporando conceitos e referências de projetos em design inclusivo, arquitetura inclusiva e acessibilidade, os designers, os arquitetos e os urbanistas têm o potencial transformador bem como a responsabilidade social de contribuir para a construção de cidades mais justas e acessíveis. Não somente garantindo a inclusão de pessoas com deficiência ou mobilidade reduzida, mas atuando proativamente na construção de espaços privados e públicos mais democráticos.

O uso da tecnologia em projetos de arquitetura inclusiva

Vá além! Não pense apenas em soluções inclusivas e de acessibilidade para pessoas, mas com pessoas.

O design e a arquitetura inclusiva não precisam ficar limitados à experiência final do usuário, ou seja, ao momento final do projeto, quando o espaço, o edifício ou o utensílio já está pronto. É importante que os diversos usuários participem de forma ativa e colaborativa no processo de projeto e desenvolvimento das soluções construtivas e de design.

Em um recorte mais específico, dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) de 2014, apontavam que cerca de 300 milhões de pessoas no mundo apresentavam algum tipo de deficiência visual (sejam pessoas totalmente cegas ou com baixa visão). Esse grupo é um dos que encontra mais obstáculos ao transitar pelas cidades ou utilizar algum objeto, podendo gerar discriminação, exclusão e desigualdade.

Por isso, é necessário educar a população de forma a estabelecer relações sociais mais inclusivas, democráticas e atentas às diferenças existentes entre as pessoas. Um possível desdobramento de uma visão mais democrática pode ser percebido no desenvolvimento de novas tecnologias que buscam oferecer ferramentas de projeto para designers e arquitetos-urbanistas.

É fato que o uso da tecnologia ampliou as possibilidades de inovação, considerando ferramentas de modelagem de fabricação digital. Uma delas, a Planta Tátil, ou Maquete Tátil – modelo físico em escala reduzida que apresenta formas, volumes e outros detalhes dos espaços a serem construídos -, é um instrumento de projeto colaborativo que se tornou amplamente acessível e viável devido ao desenvolvimento e evolução das tecnologias de softwares de design, fabricação digital, corte a laser e impressão 3D.

Pensando em pessoas com visão reduzida ou cegas, o estímulo sensorial estimula o desenvolvimento do raciocínio projetual, contribuindo para a elaboração individual das percepções sobre as experiências com as cidades, edificações ou utensílios. Tais percepções auxiliam na elaboração de soluções de design para a arquitetura de espaços e cidades inclusivas e acessíveis.

Vale destacar que plantas e maquetes não demandam tecnologias de alta performance para serem utilizados. Ainda assim, os novos softwares otimizaram significativamente o processo de desenvolvimento de projetos e modelos físicos. Efeito já percebido, o processo criativo de designers, arquitetos, e urbanistas tem se tornado mais colaborativo, permitindo a atuação daqueles que compreendem mais as necessidades do dia a dia: os usuários.